
Imagem retirada da Internet. Foto: Chico Nelson.
* Por Vinícius Natal
Se o mundo é uma casa, talvez a janela seja a parte mais encantadora. A janela, aliás, é uma coisa linda. Através de uma cavidade na parede revestida em ferro/madeira, conseguimos ver o que não mora em nós. Habitamos o outro e, então, nos reconhecemos como diferentes, mas também particular nas nossas incertezas. Que maravilha a janela...
O samba, então, é a janela do mundo, daquelas bem escancaradas que fazem circular o vento das ideias e o hálito de alegria que nos embriaga. Alegre e sisuda, é a vista daqueles foliões que vivem e respiram batuque o ano inteiro. Isso não é nenhum problema, a partir do momento em que essa janela permaneça aberta, de preferência sem trincas ou chaves, pois enxergar o que está fora do conforto requer observar a rua como um casal apaixonado.
Assim, o samba nos mostra através dos passistas que é bacana sambar, mas também é importante saber que passista não é piranha e que o machismo está entrando na nossa sociedade. Discute-se o gênero.
Também nos mostra como é divertido ver os desfiles e os carros super bem acabados e iluminados, mas devemos enxergar que para aquilo ser feito, dezenas de pessoas suaram a camisa e trabalharam para que aquilo ocorresse. Aliás, como essas pessoas trabalham? Com que segurança? Recebem em dia? São respeitadas? Abre-se a discussão para as relações de trabalho no mundo, e isso diz muito sobre nós, pois trabalhamos.
A janela ainda pode nos fazer ver a relação com nossa própria história, a partir do momento em que as escolas de samba cantam - e recontam - negros e índios. Entre diferentes olhares do Brasil, podemos perceber que um enredo narra na avenida, mas também nos faz enxergar um Brasil que escreveu sua História com caneta tinteira de sangue indígena e negro.
O samba é esse complexo de saberes que tem na roda a sua origem e permanência de uma herança ancestral africana, ressignificada em afrobrasilidade. Floresce e tece em redes. Nó que une os mundos. Canção que embala os corpos. Contradição que se revela Brasil.
É possível ver o mundo através do samba, linda janela festiva e problematizadora.
Basta querer ver.
Uma vez me perguntaram:
- Mas você só estuda samba?
Fiquei pensativo e, hoje, penso na resposta que poderia ter dito:
- Sim, veja bem. O samba abraça o mundo. E o mundo é pra brincar.
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